Atende pelo pomposo nome de "prescrição da pretensão punitiva" um dos mecanismos garantidores da impunidade de parlamentares, no âmbito do Supremo Tribunal Federal. É que deputados e senadores, por terem prerrogativa de foro, são processados e julgados pelo STF, aquele que "acerta e erra" por último, nas palavras de Gilmar Mendes, cuja passagem pela presidência do Supremo foi cercada de polêmicas. No final de novembro, o STF arquivou, sob a relatoria da ministra Ellen Gracie, ações por crime eleitoral contra o senador Mão Santa e o deputado federal Ciro Nogueira, ambos do Piauí, por pedido do próprio Ministério Público Federal, autor das denúncias. É que ocorreu a tal prescrição da pretensão punitiva do Estado, porque a pena cominada ao crime de que foram acusados seria de, no máximo, um ano de detenção. Nessas condições, depois de quatro anos, a prescrição já se operou, conforme a legislação penal. A denúncia foi oferecida em 2006 e, em novembro de 2010, ainda não tinha ocorrido o julgamento. Foi o mesmo caso, mesmas datas, do deputado federal paulista Abelardo Camarinha, cujo relator foi o ministro Joaquim Barbosa.
As prescrições, de basicamente dois tipos (da pretensão punitiva, antes de uma sentença definitiva, e da punição executória, depois de fixada a pena em sentença definitiva), são garantias do cidadão contra o Estado, que, se é o único com o poder de punir, também não pode manter indefinidamente uma situação em que o acusado não é nem condenado nem absolvido, ou que, condenado, não cumpre a pena (ao fugir, por exemplo). Mas a prescrição da pretensão punitiva funciona também como uma espécie de atestado do fracasso do Judiciário em processar e julgar os acusados por crimes, especialmente quando se trata de senadores e deputados, a demonstrar a ineficiência do STF.
Senador por um dos Estados mais pobres do Brasil, o Piauí, Mão Santa é conhecido por seus longos e vazios discursos na tribuna, que sempre usou como uma espécie de parque de diversões político. Nas últimas semanas, tem sido uma delícia ouvir, ainda que só pedacinhos, porque muito enjoa (enoja), desses discursos transmitidos pela TV Senado. São discursos de perdedor, repletos de mágoas e acusações vazias: é que Mão Santa, que nos finais de sessão com plenário já vazio costuma ocupar a cadeira da presidência da Mesa, e seu colega piauiense Heráclito Fortes, o defensor de Daniel Dantas no Senado, não foram reeleitos. O que já era patético agora está hilário. Heráclito, secretário da Mesa, a quem coube a responsabilidade de conduzir a "reforma administrativa" após uma sucessão de escândalos e denúncias sobre irregularidades no Senado, pouquíssimo fez, apesar de ter contratado auditoria da Fundação Getúlio Vargas. Mais dinheiro jogado fora.
Figuras como essas dão bons motivos aos defensores do unicameralismo, com a extinção pura e simples do Senado Federal, composto por três representantes de cada Estado da Federação, independentemente de seu tamanho, expressão econômica, populacional ou política. Na teoria, uma beleza. Na prática, uma congregação das práticas coronelistas, conservadoras e atrasadas do Brasil, especialmente quando se trata de Estados do Nordeste e do Norte. Foram figuras como essas que acabam de elevar o salário-base dos deputados e senadores, que subiu de R$ 16.512,09 para R$ 26.723,13. São quinze desses salários por ano, mais os demais benefícios, mas, na verdade, os senhores senadores embolsam mensalmente ao redor de 100 mil reais, conforme dados da Transparência Brasil e do site Congresso em Foco, divulgados em julho.
Razão tem o professor Julinho Mendes: "Fala sério, meu! Vai tomar no cutucado do dedo mindinho! Esse não é, em definitivo, um país sério! Sério é o Japão, a China que investiu no professor e na educação de seu povo e agora colhe os frutos do desenvolvimento."
- Texto originalmente publicado na revista eletrônica O Guaruçá, em 24/12/2010.
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