Fevereiro teve dois dias especialmente chuvosos, uma sexta-feira, 22, e uma quarta-feira, 27, que provocaram estragos e deixaram desabrigados, em Ubatuba. Por sorte, ninguém morreu - desta vez. Mas há áreas de risco no município e uma delas é exatamente aqui, desde as primeiras cotas do Funhanhado, onde recentemente a Defesa Civil fez um treinamento, junto com a população, para que todos tenham ao menos uma noção do que fazer em caso de desastre.
Há duas situações potencialmente perigosas, quando se trata de chuvas. Uma delas é um acumulado muito grande concentrado em poucos dias, como foram os casos do vale do Itajaí, em Santa Catarina, que por duas vezes viveu grandes tragédias, e da região serrana do Rio de Janeiro. A outra é um volume apenas razoável de chuva em muitos dias, mas que acaba encharcando o solo. No vale do Itajaí aconteceram as duas coisas. Em basicamente três dias o acumulado passou de 400 mm, e o total de todo aquele novembro de 2008 chegou a inacreditáveis 1.000 mm, deixando o solo muito encharcado e pesado, com escorregamentos de terra contados na ordem de milhar. O solo, disseram os geólogos, demorou cerca de seis meses para se estabilizar. Na região serrana do Rio a tragédia foi maior, em número de vítimas, e mais concentrada, numa região de encostas traiçoeiras, formações da mesma natureza que temos por aqui.
Solo encharcado é sempre um risco, e quem sobe e desce frequentemente pela Tamoios sabe que os escorregamentos podem acontecer em dia de sol, sem que esteja chovendo naquele momento. Nos dois primeiros meses do ano a Defesa Civil apontou acumulado de 750 mm, disse a Prefeitura de Ubatuba em nota. Nesse quadro de solo já encharcado, não foi de estranhar que a chuva do dia 22 de fevereiro causasse estragos, atingindo, em maior ou menor grau, cerca de 150 famílias.
O que aconteceu naquela sexta-feira? O Comitê de Bacias do Litoral Norte tem uma página abastecida com dados do Centro Integrado de Informações Agrometeorológicas - CIIAGRO, que opera um pluviômetro na margem direita (sentido Taubaté) da rodovia Osvaldo Cruz, aproximadamente 600 m antes do posto da Polícia Rodoviária e a uns 5.300 metros da praia de Yperoig, aproximadamente no centro do fenômeno que castigou especialmente os bairros Ipiranguinha e Guarani. O CIIAGRO teve a gentileza de disponibilizar dados brutos de seus arquivos, que permitiram entender melhor a sequência dos acontecimentos. Os dados do pluviômetro são coletados de 20 em 20 minutos.
Naquele dia 22, as primeiras chuvas foram registradas às 14:20 horas e, até as 15 horas, o total havia chegado a 23,1 mm. Das 18 às 19h20 choveu mais 13 mm. E das 20h20 até as 22, em 1h40, foram mais 133,4 mm, com muita ventania e raios. O total, desde as 14h, foi de 173,2 mm, o que vale dizer tomar um quadrado de um metro por um metro e despejar 173 litros de água nele, o que fará o nível subir os exatos 17,3 centímetros. Não parece muito, mas isso é o que ocorre em cada metro quadrado. Se isso for multiplicado pela área dos bairros afetados será um volume absurdo de água. Quem se der ao trabalho de fazer esse pequeno experimento verificará que, dependendo do solo, a absorção será muito lenta. Se houver um dreno inferior no experimento, a vazão será muito alta.
Dia 26 de fevereiro o total das chuvas foi de 30,2 mm, e no dia 27, uma chuva forte atingiu 70,1 mm. Luiz Eduardo Carpinetti de Souza, leitor de O Guaruçá, registrou resultado numa rua do centro. Mais famílias afetadas, mais estragos.
Defesa Civil e Prefeitura estão atentas, e pedindo doações. É hora, sim de solidariedade, e é hora de Ubatuba entender que esses podem ser avisos de uma tragédia maior. Em algum momento será necessário cumprir planos e agir, removendo para locais dignos os moradores hoje em áreas de risco.
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