terça-feira, 12 de março de 2013

Cri-cri cobra promessas de campanha em Ubatuba


"Uma das propostas de campanha do PT em Ubatuba foi a implantação do orçamento participativo. No entanto, mudar práticas, comportamentos e mentalidades é bastante difícil e demorado. Não se pode perder tempo e ocasião." Rui Grilo, em Promessas de campanha em Ubatuba, um cri-cri.

Narigão de cera
As honestas e por vezes ingênuas reclamações de ativistas petistas históricos me comovem. Política não é coisa para ingênuos, como não foi para o "ingênuo" (uma das designações históricas, constitucionais e legais dos indígenas brasileiros) cacique Juruna, o primeiro indígena eleito deputado federal (pelo PDT de Brizola) no Brasil. Juruna, de vez em quando, ostentava uma borduna, como símbolo de sua combatividade, mas a história registra que jamais desferiu golpe em quem quer que seja. Combativo, mas pacífico, pacifista. Ingênuo, Juruna acreditava nas pessoas, nas palavras das pessoas, mas logo descobriu que as pessoas negavam que tivessem dito as palavras. Ingênuo, mas atento à tecnologia da época, Juruna conseguiu um gravador "para registrar tudo o que o branco diz". Creio que andou perdendo a ingenuidade quando descobriu que, o que branco dizia e ficava gravado, pouco significava, porque as atitudes, as práticas, as ações e comportamentos negavam o dito e gravado. Em homenagem ao cacique xavante, etnia que me é pessoalmente cara, batizei de Juruna o gravadorzinho digital que uso quando faço entrevistas, fontes primárias para textos destinados à publicação aqui em O Guaruçá, nossa oca eletrônica.

O até agora escrito não foi apenas um simples nariz de cera, que a imensa maioria dos jornalistas considera como algo (em oposição à técnica do "lead") absolutamente desnecessário. Foi um narigão.

Cri-cri
Rui de sobrenome Grilo é, certamente, um cri-cri, que azucrina os poderosos de plantão. Que já teve fortes embates com juízes e promotores, porque pretendia apenas exercer, dentro dos limites constitucionais e legais, seu direito à cidadania. É colunista aqui de O Guaruçá, umas 12 respeitáveis páginas de títulos de matérias. É um confesso ativista da Educação Popular, petista convicto, tem problemas de saúde semelhantes aos que eu tenho, não está à cata de vaguinha remunerada (nem eu estou). Conserva, preserva, um quê de saudável ingenuidade, mas não é um ingênuo e sabe estrilar quando percebe que as coisas não vão bem (quero ser assim também).

Grilo, cri-cri, foi ao ponto, quanto a seu próprio partido, o PT: orçamento participativo foi promessa de campanha. Orçamento participativo não nasce pronto, não é feito depois, é feito participação antes, no primeiro momento possível, no momento mesmo da simples sabatina sobre o orçamento (execução orçamentária) anterior. Ou é participativo, tem a participação do povo, ou é apenas o ramerrão useiro e vezeiro em política (especialmente na nanica), apenas palavras que, mesmo quando gavadas em gravador de voz ou texto, não podem ser levadas a sério.

Nem adianta tentar pretender que o cidadão comum sequer leia um trechinho do orçamento. Lê-lo todo (especialmente os anexos) é impossível, é o mesmo que ler um dicionário em chinês clássico. Como diz Grilo, "poucos aguentam a leitura de balancetes e estatísticas. No entanto, as dúvidas e questionamentos de cada um podem ir revelando o que se esconde através dos números." É nisso que podem ajudar os funcionários municipais especialistas nos números, assessorando os políticos que decidem sobre esses números, ambos explicando, resumidamente, o que diz o orçamento e o que se fez e se pretende fazer com os recursos previstos nele. Tenho comigo que nem é muito o caso de perder tempo com números, mas só entender os grandes números e seu impacto em cada segmento dos vários setores: Educação, Meio Ambiente, Obras aqui no meu bairro. E, em cada oportunidade, dizer com todas as letras e números, bem grandes, o percentual de gastos com pessoal, que sempre precisará ficar abaixo de 60% da receita corrente líquida, o limite imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Quanto mais abaixo melhor, mas sem estrangular a operacionalidade da gestão municipal. É um fio da navalha, um cobertor curto que precisa ser bem administrado, é absolutamente necessário saber dizer "não" a algumas pretensões dos funcionários, especialmente salariais. Não é coisa fácil e pode virar pesadelo. Uma das causas do desgoverno anterior certamente foi a opção pela "enorme turma" e o desequilíbrio que causou, privilegiando uns em detrimento de muitos.

Transparência
Até agora, a transparência não é o forte do governo de Maurício Moromizato. Pode parecer incrível, mas até Eduardo César cumpria a lei, ao publicar no site da Prefeitura a execução orçamentária, valendo até agora a palavra dele de que deixou uns 17 milhões em caixa, em 31 de dezembro, porque os empenhos de janeiro ainda não foram publicados. De primeiro de janeiro até agora o site da Prefeitura, exceto Secretaria da Fazenda, está fora do ar. E, mesmo nos domínios dessa Secretaria, nada de publicação sobre a execução orçamentária. Tarcisio Carlos de Abreu, o titular da pasta, está permanentemente em reunião ou viajando, não retorna recados: vale dizer, está inacessível, o que faz lembrar o secretariado de Eduardo César, administração que tinha horror a transparência e a dar informações que não fossem através da ufanista assessoria de comunicação. Na Secretaria da Fazenda, se algo mudou, até agora foi para pior. O discurso era mudar, mas para melhor, para fazer Ubatuba brilhar.

Há outra promessa de campanha que não está sendo cumprida. O próprio prefeito blindou-se e não está cumprindo uma das promessas de campanha, feita no auditório da Unitau quando de um evento com candidatos a prefeito, patrocinado por uma obscura "Comissão de Cultura". Maurício disse que ele, pessoalmente, ele prefeito, ouvir a população diretamente, em um dia da semana, era "algo para se tornar obsoleto", algo até que a população tivesse confiança no funcionalismo e nos secretários das várias pastas. Esse algo até agora não aconteceu e o prefeito está tão blindado, especialmente por seu chefe de gabinete, que falar com ele é, na prática, impossível. O chefe de gabinete, parece, vê inimigos por toda a parte, e citou nominalmente o UbaWeb. Se fosse médico e trabalhasse na Santa Casa o chamaria, certamente, de deus do gabinete.

Maurício, instado a ser participativo
Diz dito popular que, se conselho fosse algo valioso, seria vendido e não dado "de grátis". No entanto, conforme os princípios da solidariedade, conselhos, recomendações e dicas oriundos da experiência devem ser ofertados por seu conteúdo intrínseco, gratuitamente. Maurício, com toda a certeza, empenho minha palavra, minha honorabilidade (porque estava presente com ouvido de escutar, e sou surdo do ouvido direito, ouço melhor a voz da esquerda), ouviu conselho sobre orçamento participativo, de um prefeito que foi eleito e reeleito e hoje é deputado estadual, uma referência estadual no partido dele, o PT. O conselho foi de uma simplicidade cativante: "Maurício, tudo, qualquer coisa, que diga respeito a orçamento participativo, precisa ter a presença do prefeito. Não basta mandar os secretários. É o prefeito, pessoalmente, que precisa ouvir, que precisa levar (além das pauladas) ao seu coletivo de governo, à estrutura de governo, o que o povo pede".

Uau, Maurício, Ubatuba vai efetivamente brilhar, se não tiver orçamento participativo com participação popular e participação do prefeito?

Adendo
Meu pai, Joel, dizia sempre que na ascendência de sua família - e minha ascendência, consequentemente - havia uma bugra mato-grossense, coisa que meu avô paterno Ignácio, farmacêutico prático, cego de catarata desde a pouca idade de uns 60 anos, confirmava, dizendo que era uma xavante alta, grandona, esguia. Que eu saiba, não há registro de fotos, mas os traços paternos não negavam que algo dos genes da bugra estavam presentes. Certamente herdei alguns desses genes e, talvez por conta deles, tenho um carinho especial pelos povos indígenas e, destes, algum carinho especialíssimo pelo povo Xavante, o povo do cacique Juruna, o ingênuo do gravador.

- texto publicado originalmente na Revista Eletrônica O Guaruçá, em 12/03/2013
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