segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Enfim, Ubatuba brilha na Praia Grande

Um brilho pequeno, azulado, mas o atual “governo municipal” faz Ubatuba começar a brilhar. Depois de semanas de tempo chuvoso ou simplesmente nublado, enfim, um sábado ensolarado, dia 14 de dezembro, em Ubatuba. Sul da Praia Grande, perto do Quiosque Coqueirinho, um gazebo. É um tipo de tenda de praia cujo nome parece um palavrão. Sob uma tenda branca desse tipo, que tem quatro pés de sustentação, um fogareiro de duas bocas e um botijão pequeno de gás GLP. Um brilho pequeno, azulado, mas Ubatuba começa a brilhar. Cheiro forte de gordura de carne de segunda, fumaça, atraindo moscas grandes, conhecidas como varejeiras, fedor espalhando-se pela praia apinhada de turistas – quiçá algum morador também.

Se, para minha comodidade, prefiro usar os serviços de um quiosque, é decisão minha. Mas não sou obrigado a consumir alimentos e bebidas nos quiosques de praia, alguns dos quais (nem todos) exorbitam nos preços. Ninguém retira de mim o direito, se eu quiser, de levar minha farofa para a praia. Mas farofa pronta, porque não posso montar na praia uma cozinha, churrasqueira nem menos ainda destilaria de cachaça ou tanque de fermentação de cerveja. Nem posso deixar na areia da praia quaisquer restos de farofa, gorduras intragáveis, pão com mortadela Marba, ossos do frango assado, pontas de cigarros, copos descartáveis, latinhas de cerveja e refrigerante, PETs, lenços de papel e tudo quanto é lixo que eu, turista ou morador, gero em profusão. A quem cabe fiscalizar isso? O quiosqueiro, de boa vontade, pode ajudar, mas não tem a obrigação. O morador ou turista com um pouco mais de consciência não precisa brigar, mas pode, voluntariamente, recolher o lixo que outros deixam na praia – e, por alguma razão obscura, ao mencionar “outros” as palavras “Tarba” e “São Zé” sempre me vêm à cabeça. Cabe ao poder público municipal botar ordem no galinheiro. Tem fiscais e uma Guarda Municipal para isso, cujo lema “Apoio ao turista” jamais pode ser confundido com “Apoio ao sem noção, turista ou não”.

Esse tipo de uso da praia, o pequeno brilho azul dos fogõezinhos e vermelho dos braseiros, tem imenso potencial de virar epidemia, do tipo dengue. É necessário combater esse tipo de coisa quando ainda no início, porque depois fica muito mais difícil. Claro, é necessário combater se essa for uma decisão política, mas pode ser que a decisão política seja de outra ordem, a de permitir esses pequenos brilhos azulados e avermelhados nas praias do nosso pedaço do Litoral Norte. Afinal, de uma forma ou de outra, é brilho, “né não”?

Sabem o que faltou? Penitencio-me. Uma foto para documentar o triste episódio. Mas, de qualquer forma, foto não grava fedor de gordura ruim, sufocamento por fumaça fedorenta em narinas vizinhas, nem varejeiras pululando.

- texto originalmente publicado na revista eletrônica O Guaruçá, em 16/12/2013. 

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Ubatuba, perigo na `Rod. Osvaldo Cruzes´

O feriado nacional desta sexta-feira, dia 15 de novembro, em celebração da proclamação da república, aponta para intenso incremento do tráfego de veículos pela Rodovia Osvaldo Cruz, porque, dizem a Dersa e a mídia, a Tamoios tem tráfego lento, quase parando, devido às obras de duplicação no trecho do planalto, com entrega prevista para 16 de dezembro (alguém acredita?).

A rodovia estadual SP-125, de 91 quilômetros, começa em Taubaté, no Vale do Paraíba, passa pela Serra do Mar e termina em Ubatuba. É a ligação entre duas rodovias federais, a Dutra e a Rio-Santos. Seu nome oficial, por lei, é “Rodovia Oswaldo Cruz”, em homenagem a um ilustre filho de São Luís do Paraitinga, cidade que fica no quilômetro 39. É uma rodovia que oferece muitos perigos, como lembram as muitas cruzes que tem. Ao descermos pela Osvaldo Cruz há uns dois meses, contamos, eu e a Marlene, ao menos 49 cruzes nas margens das muitas curvas e nos poucos trechos planos e retilíneos. Geralmente são pequenas cruzes simples de madeira, de dois tamanhos básicos: um para indicar adultos, outro, menor, para indicar a morte de crianças.

Postulo que essas cruzes registram a morte de moradores das imediações, de habitantes que foram vítimas de colisões, capotamentos ou, principalmente, atropelamentos. Talvez até de algum assassinato. É que muitas dessas cruzes, às vezes encimando pequenas casinhas tais como capelinhas ou oratórios, estão bem cuidadas, pintadas, e até ornadas com flores de plástico ou, mesmo que já meio murchas, com flores naturais. São cuidadas, preservadas, coisas de gente deste nosso pedaço de terra. Outras, é certo, perdem-se nas brumas do tempo, desbotadas, degradadas, porque talvez já mortos os próprios parentes e amigos cuidadores dos pequenos monumentos.

As pequenas cruzes, os pequenos monumentos estão a nos lembrar sempre da morte - memento mori, porque todos nós vamos morrer. Colocá-las nos locais da morte é um costume popular muito antigo do qual há registros em todo o Brasil, desde, especialmente, o Nordeste, onde há muitas e muitas, até o Sul, até o Rio Grande, terra de Luiz Menezes, que nasceu século passado, 1922, e morreu neste, 2005, em Quarai. Deixou registrada em seu poema "Último Pouso" (trecho abaixo) a visão de uma cruz solita:
Basta morrer pra ser bueno,
basta sofrer pra ser justo,
quem nasce ou morre de susto
nem frase fingida tem;
e dizer que no além
as almas são tão iguais!

Pra que estes luxos demais
depois que somos ninguém?
Mais feliz é a cruz solita
longe no ermo da estrada
sem fita, sem flor, sem nada
marcando o fim de uma vida...

Fica dormindo aquecida
no sol que logo a desbota,
sem frase fria ou lorota
nessa sesteada comprida...

Gosto da cruz do proscrito
na solidão da campanha,
tendo a garrafa de canha
por promessa recebida;
me dêem esta cruz perdida
pra que o gaúcho passando,
viva sempre me acenando
numa eterna despedida.

Deve ser um costume popular de origem portuguesa, ainda que na Portugal de hoje não mais sejam vistas cruzes às margens das autoestradas, as IP (itinerário principal) e IC (itinerário complementar). Mas talvez existam nas complementares EN (nacionais) e nas ER (regionais), que por estas, secundárias, minhas filhas Ligia e Elka dirigiram o carro alugado, mas Marlene só registrou a presença de cruzes em acessos às aldeias, especialmente na região de Montalegre, Trás os Montes.

Aqui também é assim, nas margens das grandes rodovias, e cito a do Oeste (Castelo Branco), a Ayrton Senna e a Carvalho Pinto, onde também não existem as pequenas cruzes.

Elas, as cruzes, marcam as mortes por acidente e também as mortes por assassinato. Quando eu era criança pequena curumim mesmo caipira em Araraquara, no interior de São Paulo, tinha pavor de uma cruz solita no Estradão, uma rua de terra que marcava o final da Vila Xavier e onde havia um boteco mal-ajambrado, assustador, conhecido como Risca-Faca. A cruz ficava a poucos metros do boteco, na junção com a rua que ganhou o nome de Risca-Faca, que tinha uns casebres assemelhados a cortiços, para onde a arquitetura da gentrificação, ainda pela década de 60 do século passado, já tinha expulsado os pobres e miseráveis, os famosos “menos afortunados”. Era o pavor da certeza da morte associada à incerteza do risco, porque se alguém já tinha morrido lá de morte matada, assassinado, será que eu, pequenino, não seria o próximo?

Talvez esteja a dizer tudo isso porque, com o coração confrangido, recomendei ao meu filho Juliano que viesse para cá pela rodovia Osvaldo Cruz, a das cruzes, contrariando a orientação anterior que dei antes de saber do monumental congestionamento da Tamoios.

Osvaldo Cruz
Era um autoritário, o médico sanitarista Osvaldo Cruz. Um autoritário a mais, num dos vários períodos da história brasileira nos quais o autoritarismo era dominante e dava as caras, para o bem e para o mal. Osvaldo Cruz foi, se é que essa figura existe, um autoritário do bem, não pelos princípios ontológicos que jamais podem justificar o autoritarismo, mas pelos resultados que conseguiu.

Osvaldo Cruz conseguiu, em 1903-1904, com seus batalhões “mata-mosquitos”, eliminar os focos de Aedes (do grego, odioso) aegypti (do latim, “do Egito”), os mesmíssimos pernilongos que hoje transmitem o flagelo da dengue, com registro de epidemias aqui em Ubatuba em tempos muito recentes. Naquela época (e, potencialmente, hoje) esses pernilongos transmitiam a febre amarela. Autoritário, conseguiu uma Lei da Vacina Obrigatória contra a varíola, que teve como resultado a Revolta da Vacina no Rio de Janeiro, em 1904, que deixou uns 30 mortos e foi muito mais intensa do que as manifestações de junho deste ano. O governo de então recuou, suspendeu a vacinação obrigatória, mas depois instituiu um programa sustentável que iniciou o combate, através da vacinação voluntária, que culminou com com a erradicação da varíola no Brasil por volta de 1970. Em 1980 a Organização Mundial da Saúde, da ONU, considerou a doença como erradicada em todo o mundo. Olhe seu braço, em geral o esquerdo: se tem uma cicatriz circular, de cerca de um centímetro de diâmetro, você foi vacinado contra a varíola, vacina muito provavelmente produzida pela Fiocruz. Se não tem, nasceu depois de 1980. É bom lembrar que a doença que mais matou os primeiros habitantes daqui do litoral (afora os sambaquieiros), os Tupinambá, Tamoio e todos os outros povos indígenas, foi a varíola, trazida pelos europeus, portugueses principalmente.

Osvaldo Cruz correu riscos, inclusive científicos, mas, no fim, deu tudo certo. Nenhuma atividade humana, nenhuma iniciativa científica, nenhuma inovação, é isenta de riscos: é afirmação tão correta como a de que qualquer ser vivente, humanos em particular, algum dia vai morrer, morte irreversível. Não fosse assim Lázaro estaria vivendo entre nós até hoje e Matusalém teria uns incríveis 5 mil anos de idade, para ficar na referência dos livros sagrados do Cristianismo, o novo e o velho. Se nenhum milagre é impossível pelo Deus criado pelo Ocidente, o de manter alguém vivo em carne e osso incorruptíveis e funcionais desde o nascimento, esse milagre impossível ainda não aconteceu.

À margem, é sempre bom citar um pretenso autoritário do bem, Hilary Koprowski, criador de uma das vacinas contra a poliomielite. Outros foram Jonas Salk e Albert Sabin, este último o que criou a vacina que erradicou a poliomielite no Brasil, a que é administrada na forma de gotinhas orais. Koprowski usou, para desenvolver sua vacina, entre 1957 e 1960, cobaias humanos pretos e pobres, no então Congo Belga, em Ruanda e em Burundi. Foram vacinados compulsoriamente, sem saberem o que estava sendo injetado neles. Colocados num mapa, esses locais foram aproximadamente a mesma região onde, anos depois, apareceram os primeiros casos de AIDS em humanos, o início da epidemia mundial. Hoje há considerável base científica para a afirmação de que a doença era endêmica nos primatas usados para a produção das vacinas de Koprowski.

A Proclamação da República
A “Proclamação da República” foi um ato autoritário, ou, menos que ato, um fato autoritário creditado ao indeciso marechal Deodoro da Fonseca (quando eu era criança pequena caipira me falavam sempre, como que um gancho mnemônico, “Deodoro da Fonseca, perna fina, bunda seca”). Uma quartelada, um golpe, cujo cordel detonante foi o boato, depois revelado como inverídico, do decreto de prisão contra Deodoro, pelo governo do primeiro-ministro (do Império), visconde de Ouro Preto. O velho marechal era amigo do imperador Dom Pedro II e, no próprio dia 15 de novembro do ano de inauguração da República, bradou vivas ao imperador.

Assim como a Ubatuba em que vivemos é a “Ubatuba dois” (porque a “Ubatuba um” dos relatos de Hans Staden é da região de Angra dos Reis), a história é contada mais pelo que convém do que pela pesquisa de fundo realmente científico.

A República só se legitimou no plebiscito de 1993, regime que teve a preferência de 86,6% dos eleitores, contra 13,4% que foram a favor da monarquia (computados somente os votos válidos).

Osvaldo ou Oswaldo?
Enquanto vivo, Oswaldo. Morto, Osvaldo. A morte chega para todos, inexpressivos anônimos como a imensa, esmagadora, maioria de nós, como também para os poucos célebres em vida ou após a morte. Osvaldo Cruz tornou-se respeitada celebridade ainda em vida, médico sanitarista e epidemiologista de profícuo e criativo fazer. Deixou legados, entre os quais a internacionalmente conhecida e respeitada Fundação Oswaldo Cruz, que tem história e credibilidade suficiente para ignorar o que diz a Wikipedia: “A grafia original do nome do biografado, Oswaldo Gonçalves Cruz, deve ser atualizada conforme a onomástica estabelecida a partir do Formulário Ortográfico de 1943, por seguir as mesmas regras dos substantivos comuns (Academia Brasileira de Letras – Formulário Ortográfico de 1943). Tal norma foi reafirmada pelos subsequentes Acordos Ortográficos da língua portuguesa (Acordo Ortográfico de 1945 e Acordo Ortográfico de 1990). A norma é optativa para nomes de pessoas em vida, a fim de evitar constrangimentos, mas após seu falecimento torna-se obrigatória para publicações, ainda que se possa utilizar a grafia arcaica no foro privado (Formulário Ortográfico de 1943, IX).”

Autoestrada ou auto-estrada? Pelo novo Acordo Ortográfico, “autoestrada”. Mas Portugal resiste e lá ainda se grafa “auto-estrada”, da mesma forma como lá troço, entre outros significados, é um pedaço de uma estrada.

São Luiz do Paraitinga ou São Luís do Paraitinga? Sobre paraitinga há poucas dúvidas, trata-se de (pará) um rio grande e bem claro, branco (i-ti-inga). Mas se São Luís é como se deve escrever, São Luiz é o nome oficial da cidade, pela qual passa o grande rio tinga, de águas claras, brancas e que, de vez em quando, causa estragos, como nas enchentes de 2010.

- texto originalmente publicado na Revista eletrônica O Guaruçá, em 15/11/2013. 

terça-feira, 5 de novembro de 2013

Tropixel Ubatuba, alienação e pluviômetro

Marlene me chamou a atenção para algo que eu já tinha percebido. Boa parte da plateia dos eventos do Festival Tropixel (faz parte da rede Pixelache, e é Tropixel porque aqui por Ubatuba passa o Trópico de Capricórnio), mês passado, teve realmente característica multimídia.

Pessoalmente acho no mínimo descortês, para não dizer falta de educação, falar ao telefone (ou mesmo deixá-lo ligado) quando tem um orador se esforçando para transmitir por voz, ao vivo, sua mensagem. O que dizer, então, de quem, “ouvindo” o orador, fala ao telefone celular e, ao mesmo tempo, tecla e rola telas no tablet? Marlene é psicóloga, da linha psicanalítica (uma das oitocentas e quarenta e sete que existem...), e já me falou que, na clínica, há algo chamado de atenção flutuante, uma técnica que o povo da psicologia usa para, mais do que ouvir, escutar o paciente sem privilegiar a priori qualquer elemento do discurso dele. É coisa do tio Sigmund, mas é técnica que se aplica à prática clínica da psicologia, não a um painel, exposição, palestra ou o raio-que-o-parta quando tem alguém falando para uma plateia. Tem gente que consegue... Consegue tomar café (um aroma delicioso se espalhando para a fileira de trás, onde estávamos, e nem se deu ao trabalho de oferecer...), fazer uma boquinha com um lanchinho de ocasião, ao mesmo tempo em que, ou seja, simultaneamente, tem fone em um dos ouvidos, escorrega o dedo na tela do tablet e dedilha no smartphone. Vá ser multimídia assim na caixa-prego (melhor dizendo, "Caxa-Prego" (sic), um quiosque do Itaguá, onde sempre tem um bom peixe frito, especialmente o porquinho, quando nas épocas próprias), porque tem mais cara de atenção dispersa, um dispersivo comportamento de captar ruídos mas nada escutar.

O que dizer de quem traduzia para a plateia lusófona a fala de um orador anglófono e ainda conseguia atender telefone celular e tomar decisões? Tá, vamos dar um desconto, o cara era o coordenador daquela bagunça razoavelmente organizada e tinha problemas a resolver, decisões a tomar em tempo real, gente que o solicitava não apenas para dizer “boa tarde”. Refiro-me, é claro, ao Felipe Fonseca, o “efeefe” de várias postagens que já li em blogues e sites.

Houve, em todo o Festival Tropixel Ubatuba, muita alienação presente e despresente. Presente, pois havia corpo presente mas alma flutuante. Despresente porque muita gente não foi. Não por ausência (ausência é diferente de falta) mas por falta, porque, se não há falta na ausência, certamente há falta na despresença, de quem tinha tudo para ir e não foi, de quem deveria - dever - estar presente e não esteve, de quem se alienou pela despresença. Essa imagem, é claro, foi inspirada, Com Alguma Poesia, em Drummond:

Ausência
Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.

Confesso que, depois de ter ouvido do James Wallbank que fizeram, habilidosamente (o tropixélico "skil"), uma espécie de cnc com os dois componentes mais caros (os motores de passo de elevado torque) reusados a partir de “sucata” eletrônica, fiquei um tanto decepcionado ao ver uma (máquina de) cnc para corte de madeira exposta no Tropixel: uma máquina comprada pronta de um fornecedor de Guaratinguetá, logo ali em cima, no vale do Paraíba. Faltou alguma coerência entre discurso e prática. Deixei meu endereço eletrônico pessoal com o rapaz da cnc comprada pronta, para ter informações sobre o fornecedor, mas, até agora, nada... Não é o caso de insistir, já percebi que não haverá retorno, mas apenas anotar, mais uma vez, a distância entre o discurso e a prática.

Daqui a dez anos
O prefeito de Ubatuba, Maurício Moromizato, esteve presente na abertura do Festival Tropixel, e fez um discurso, quase como de campanha eleitoral, falando de seus visionários planos para daqui a dez anos. O que queremos para daqui a dez anos, lindeiros que somos das imensas riquezas do pré-sal? Educação e tecnologia são caminhos necessários, disse. Visionário, enxerga longe, mas - toda a cidade sabe - não consegue ver um palmo adiante do nariz, no dia-a-dia de uma cidade, um município, que precisa de um zelador, um caseiro, um prefeito, coisas bem menos do que um estadista e alto executivo do Poder Executivo como ele acha que é. O que me vem à imaginação é um quelônio terrestre, aparentado com um jabuti mestiço, que enxerga longe mas anda a passos curtos, devagar, quase parando, conhecido como Mamô. Que frequentemente é pego de calças curtas (a despeito de suas perninhas já bem curtas), que tem um nariz que parece encompridar a cada inverdade, porque a palavra “mentira” é feia. De qualquer forma, não foi despresente, deu o seu recado, falou muito e ouviu pouco (e nada o fará ler nem escrever), como sempre.

Bico de tucano
Hernani Dimantas, sobre quem já falei, aceitou a provocação que fiz e teve a gentileza de me responder que “como se diz na rede, tucano de cú é rola” (sic), ao bradar “sou hacker!!!”. Um parêntese: minha habilidade com a língua inglesa é tão pequena que, naquele texto provocativo, grafei “tropixélico skill” em vez de “skil”. Peço desculpas aos leitores e, especialmente, aos tropixélicos, ao tempo em que, “by the way”, relevo o acento agudo do Hernani ao grafar “cu”, essa coisa difícil em português para a qual não cabe acento, nem costuma caber em qualquer assento, penicos que o digam. À margem, e a propósito, quem não souber o que é penico basta ir à Padaria Bacana, que é um restaurante mas também um excelente bar, em frente ao Shopping Itaguá, e pedir umas cervejas no gelo. Não consigo fazer a menor ideia onde foi que o Ronaldo Dias conseguiu os penicos esmaltados, coisas hoje raríssimas, que criativamente usa (reusa) como baldes com gelo para, claro, cervejas. Ou para um bom espumante, quem sabe.

Pluviômetro
Foi gratificante perceber que Marlene, minha mulher, compreendeu melhor, na mesa com James Wallbank, de Sheffield (Reino Unido), algumas maluquices minhas, como redução, reuso, reciclagem. Ela fica indignada com minha recusa em receber como presente um computador novo, desses ultrabooks 64k como o dela, mencionando sempre minha interminável briga com as velharias que uso (reuso). Sempre preferi os velhos e envelhecidos desktops, desprovidos de suas tampas laterais para facilitar acesso às suas barriguinhas e - admito - um tanto sujos, especialmente os teclados, já que óleos, graxas e coisas de oficina integram meu universo do cotidiano. Mas atualmente uso - reuso - um notebook que herdei de minha filha Elka, um Dell Vostro 1000 velhinho de uns cinco ou seis anos, com o qual ela fez toda a licenciatura e quase todo o bacharelado em Biologia. Ele é meio lerdo, já morreu três vezes, a tecla oito simplesmente não funciona (mas basta copiar-colar a partir de qualquer tela ou texto e lá está o 8) e precisei complementar sua pequena capacidade de armazenamento com um HD externo, isso sem contar que sua memória embarcada do núcleo não passa de uma vaga lembrança. Tenho também uma m&rd@ de Toshiba STi, que herdei da Marlene, um notebook que apresentou problemas desde que chegou, zerinho, sem que a assistência técnica desse conta. É esse que pretendo usar no projeto pluviômetro.

Tentei conseguir com o pessoal do Tropixel ajuda para resolver os problemas que encontro para tornar operacional um pluviômetro de báscula, mesmo mecanismo básico dos 9 pluviômetros doados pelo Cemaden que foram instalados em Ubatuba, em áreas de risco de escorregamento de encostas. Claro que a báscula dos pluviômetros do Cemaden é de plástico abs de primoroso design e a do meu é um cano de PVC com algumas adaptações, que aquele tem um sistema digital de mensuração e registro da chuva com display de cristal líquido, e custa uns oito mil reais cada um, e este usará como interface USB um prosaico mouse e o Toshibinha de m&rd@, mas são materiais já disponíveis e o custo será baixo. Mas não deu certo: uma parte dos eventos previstos para o Tropixel simplesmente não aconteceu e, objetivamente, não consegui ajuda no Ônibus Hacker - que ouviu com atenção, mas não deu resposta, um jovem que procurava auxílio para seu projeto de um alarme automático para inundação em áreas de risco de Ubatuba.

Meu problema está nos códigos de software. Creio que já sei fazer o JavaScript ler os eventos do mouse USB, que uso (reuso) como minha prosaica interface USB para o pluviômetro, mas não consigo gravar data e horário desses eventos em arquivo txt ou csv, pois ainda não consegui criar e manipular esses arquivos. Compreendam, estou a poucos meses de me tornar oficialmente idoso e não tenho mais habilidades (ainda que tenha toda a gana, sem ter a grana) de conseguir produzir os códigos necessários.

Sobre James Wallbank, de Sheffield (Reino Unido), talvez um tucano fazendo do muro o banco onde se senta, é necessário dizer que aquele carinha simpático e meio esquisito, de falar claro e pausado, com um uma longa cabeleira composta por fios entre alourados e negros como maioria, e uns grisalhos denunciadores das décadas de vida, cabeleira contida num rabinho de cavalo, falava de experiências concretas, já realizadas, e ainda em curso, e não de meros projetos, menos ainda de quiméricas ideias. Ele foi o criador e administra um treco doku (sei lá o que significa, mas deve ser do ku e o endereço é um php "access-space.org/doku" Acess Space que ele define como um espaço de acesso, bem no meio entre a parte pobre e a parte rica de Sheffield, um espaço de acesso para pessoas interessadas em arte, design, informática, reciclagem, música, eletrônica, fotografia e em conhecer pessoas com ideias interessantes, compartilhar e desenvolver habilidades e trabalho em projetos criativos, empreendedores e técnicos. Ufa! Não é pouco. E o Access Space se dá ao luxo de declarar moratória de doações de computadores e equipamentos eletrônicos - matérias-primas para reuso e reciclagem - até o dia 18 deste mês, porque precisa utilizar, reutilizar e reciclar o que já tem. Aqui em Ubatuba, no evento tropixélico, uma das dificuldades foi obter doações de equipamentos eletrônicos para uma oficina, que acabou não acontecendo, de reuso de lixo eletrônico.

Aceito ideias e códigos
As chuvas estão às portas e o pluviômetro precisa funcionar. Todos sabem, moro em Ubatuba, litoral norte de São Paulo, num bairro onde há várias áreas com risco de escorregamento de encostas. O Cemaden instalou aqui no Perequê-Mirim um pluviômetro digital, do mais baratinho que existe (R$ 8 mil, algo completamente impossível para mim), mas na casa de um voluntário, um particular, e é em outro ponto do bairro, distante daqui. Comecei agora a pesquisar sobre Arduino e Raspberry, mas o recurso ora disponível é o Toshibinha de m&rd@. Os registros precisam dar informações sobre a chuva do momento, mas também o acumulado. Então, talvez em JavaScipt, ASC para exportar para planilha. Com muita paciência, meu guru de TI, o editor desta revista O Guaruçá, o Luiz Moura, tenta me introduzir no universo Linux, Apache, PHP, SQL e adjacências, mas sou muito lerdo (ainda que, espero, não tão lerdo como o Mamô) e, como Anibal para os romanos, as chuvas estão ad portas. Preciso de socorro, algum código fácil e pronto.

- texto publicado originalmente na Revista Eletrônica O Guaruçá, em 05/11/2013. 

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Tropixel, Ubatuba, telecentro Camburi...

Cuidem das crianças


Nem todo o abuso é de caráter sexual. Crianças podem sofrer muitos tipos de abuso, tanto no ambiente doméstico, como no escolar, como no mundo em geral, quando são desrespeitadas em seu conforto e em sua dignidade. Claro exemplo disso é o que retrata a imagem (acima) da Assessoria de Comunicação da Prefeitura de Ubatuba ao comunicar a inauguração, nesta quinta-feira, do Telecentro do Camburi, norte do Município.

Na época em que os monitores eram feitos de tubos de raios catódicos projetados em telas de fósforo verde havia fundada preocupação com o tanto de radiação que incidia sobre a face do usuário - isso naquela época em que face era rosto, cara. As telas deixaram de ser de fósforo verde e passaram a ser coloridas, mas ainda impulsionadas por um canhão de raios catódicos. Nesta época em que face é facebook não há mais essa preocupação, porque surgiram as telas de cristal líquido e de led, que não emitem radiações nocivas. Daquela época para esta consolidaram-se noções de ergonomia, de respeito ao conforto e geometria das colunas cervical e lombar e do ponto ideal entre os olhos e a tela do computador. Tema tão técnico quanto a como ligar computadores em rede e conectá-los à internet.

Criar telecentros é bom, muito bom, especialmente quando se destinam a comunidades que, por outra forma, não teriam acesso à inclusão digital. Melhor ainda quando operados em conjunto pelo poder público e por associação de moradores em áreas carentes de quase tudo. Bem melhor ainda quando é o caso de um telecentro num bairro distante de tudo e de todos, o Camburi, norte de Ubatuba, onde não chega internet com banda larga dos provedores de internet que só se interessam pelo centro da cidade e um ou outro bairro onde os moradores - permanentes ou de temporada - têm poder aquisitivo alto. Esses provedores só oferecem seus serviços onde há a perspectiva de lucro rápido e gordo. Mas nada disso é justificativa para tratar mal as crianças, colocadas ante um mobiliário feito para adultos e sem nenhuma modificação. Não é possível instalar mesas e cadeiras que respeitem as crianças? Com cuidado e criatividade é possível colocar apoio para os pés, orientá-las a aproximar a cadeira (ajustada na altura adequada) da borda da mesa e ajustar posição de teclado, mouse e monitor de forma que sejam respeitados os critérios ergonômicos e de conforto visual - detalhes que podem mudar de criança para criança, razão pela qual o operador do telecentro precisará obter esses conhecimentos, acrescentando às suas competências (habilidades, o tropixélico "skill") específicas de saber operar computadores e redes. Navegar é preciso, tão preciso quanto colocar cada criança na posição e distância certas, para cada caso particular.

Tropixel
Os meninos e meninas do Festival Tropixel apoiam os telecentros e estarão presentes (consta da programação do Festival) na inauguração hoje, quinta-feira, do telecentro do Camburi. É uma garotada brilhante, das mais variadas idades, desde os (quase) imberbes até os que ostentam carecas e fios grisalhos denunciadores de umas quase, ou pouco mais, cinco décadas de vida. Bom exemplo foi um dos oradores na tarde de terça-feira, no auditório do prédio da Unitau, brinco na orelha e uma despojada camiseta de batman, ao discorrer sobre sua experiência de acadêmico da USP com metareciclagem. Agrônomo pela USP, especializado em Marketing pela FGV, mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, doutor em Ciência da Comunicação pela USP, um dos coordenadores da Rede HumanizaSUS. Fundador e articulador do projeto Metareciclagem. Fundador do Projeto do Lixo Eletrônico no Brasil, além de ser, nas suas próprias palavras, um “artista, escritor e precursor do pensamento sobre a Internet no Brasil”. Plumas e bico de tucano, que ninguém é de ferro, ex-coordenador dos Programas AcessaSP e Acessa Escola (2009) na Escola do Futuro da USP - Programas de Inclusão Digital do Governo do Estado de São Paulo.

Reconhecido no mundo acadêmico, Hernani Dimantas foi incisivo ao dizer que é o caso de oferecer a melhor tecnologia disponível às iniciativas sociais. Fazer metareciclagem não é oferecer tecnologia ruim ou muito defasada só porque se trata do destinatário ser entidade de apoio social, cito de memória. Há que fazer o possível, mas com qualidade.

SOS crianças da Aldeia de Yperoig
Socorro, cuidem das crianças. Em Ubatuba há crianças abusadas, dizem os sinais de fumaça e, como diz a sábia sabedoria popular tanto do senso comum como do senso crítico, onde há fumaça há fogo. Cuidemos das crianças todos, todos nós, especialmente das que nos são próximas, do Perequê-Mirim, de Ubatuba, da aldeia de Yperoig, destas antigas terras de Coaquira. Há denúncias e inquéritos policiais em curso, houve prisões e mandados de soltura, há um silêncio de chumbo (segredo de justiça) mas também de ouro, porque se trata de crianças em situação de risco. Nenhum interesse político pode justificar o uso de crianças como bucha de canhão para qualquer denúncia, nem mesmo como escudo de defesa. O valor maior é a própria criança, depositária da esperança de futuro melhor para nossa gente que habita estes fins de mundo de Cunhambebe e Coaquira.

Mais há a ser dito. Mas em momento próprio, preservadas identidade e dignidade das crianças, elas sim o valor maior.

O outro lado
Procurada, a Assessoria de Comunicação da Prefeitura de Ubatuba não se manifestou sobre o assunto, até o fechamento desta edição.


- texto originalmente publicado na Revista Eletrônica O Guaruçá, em 24/10/2013.

quarta-feira, 31 de julho de 2013

Fundart de Ubatuba terá critérios para teatro


RF UbaWeb 
A presidente da Fundação de Arte e Cultura de Ubatuba - Fundart, Isabella Vassão, afirmou que o órgão se pautará por critérios previamente definidos para autorizar eventos no teatro do Centro do Professorado, quando o espaço for aberto ao público. Disse: “Sou defensora de critérios. Se o espaço é público, prioridade do poder público, das questões sociais. Se for utilizado pela iniciativa privada - e, com certeza, haverá momentos em que isso ocorrerá - terá que ser com valores estipulados, regras bem claras, com fiscalização do poder público. Não vai ser para A, ou para B, ou para C. Precisará ter edital. O que não pode é deixar a utilização para o amigo: é preciso transparência.”

Isabella disse que, pessoalmente, acha que Ubatuba precisava de um teatro, mas declarou-se contrária à forma como foi feito, “desrespeitando os espaços históricos: ele está entre a Igreja Matriz e o Casarão do Porto”. Segundo ela, poderiam ter sido identificados outros locais para a obra. “Mas já foi feito, foram aplicados recursos públicos e a Fundart tem interesse em utilizar o espaço para fomentar a cultura”. Como será a gestão ainda não foi definido, depende das conclusões de comissão, da qual a Fundart faz parte, instituída pelo prefeito Moromizato. É preciso saber “de quem será o filho: tem um monte de pais e mães, resta saber de quem será a gestão”, se por convênio com a Secretaria da Educação, ou pela própria Fundart, diretamente. A dúvida refere-se à origem dos recursos utilizados para a obra, se próprios não vinculados, que podem ser usados livremente, ou se vinculados à Educação.


Orçamento

A presidente da Fundart disse que “Eu queria um orçamento de 20 por cento, só que a gente sabe que não é possível um orçamento nem de 3% em termos reais, a gente tem que correr atrás de outras alternativas, não só recursos do poder público. Quando a gente vai atrás da Petrobras, da iniciativa privada, é que a Fundart é uma fundação, não uma secretaria.” Hoje, segundo ela, o orçamento municipal para a fundação é de 0,8%, “se no ano que vem for 1% e no seguinte 1,5% isso é o possível na atual conjuntura financeira nossa”. Simplificou: “A gente tem mesmo que gastar sola de sapato”.

Conferências de Cultura

A lei que estabelece o plano municipal de cultura foi resultado, segundo Isabella, das primeira e segunda conferências municipais de cultura, realizadas pela gestão do prefeito Eduardo César, com texto final do assessor jurídico da Fundart, advogado Valdir Aguiar Santos. Para a terceira conferência, a presidente da Fundart disse que o “principal papel nosso é ouvir a população e esse foi o tom que nós demos”, ao explicar que a Fundação realizou cinco pré-conferências, abrangendo toda a setorização administrativa da Prefeitura: norte, oeste, centro, centro-sul e sul. Essas atividades culminaram com a conferência geral, a terceira, já promulgada a legislação municipal sobre o tema, realizada em duas etapas, em junho, na qual foram trabalhados os eixos e dimensões propostos pelo Governo federal.

A presidente da Fundart referia-se ao Plano Nacional de Cultura, que previu como eixos de discussão a implementação do Sistema Municipal de Cultura, a Produção Simbólica e Diversidade Cultural, a Cidadania e Direitos Culturais, e a Cultura e Desenvolvimento. O Plano Nacional considera ainda três dimensões culturais: a simbólica, a cidadã e a econômica. A dimensão simbólica significa que qualquer pessoa pode criar símbolos, a cidadã reforça o que está previsto no art. 6º, da Constituição Federal, a cultura como um direito do cidadão, e a econômica pressupõe a economia criativa. Todos devem ser considerados quando da elaboração de políticas públicas de cultura.


Segundo Isabella Vassão, “Até 31 de dezembro, a população não tinha voz nesta cidade. Justamente por ouvir a população, a gente começou a encontrar a diversidade cultural que nós temos”. Afirmou que o carro-chefe da Fundart são a cultura caiçara, a quilombola e a indígena, “feitas por pessoas que têm dificuldade para acessar o serviço público. Elas estão na UTI, precisam então de um tratamento especial, para manter a nossa cultura, senão a gente vai perder.”

(Parêntese necessário: o projeto de lei elaborado pelo advogado motorista Valdir foi elaborado antes de "31 de dezembro".)

A presidente falou que há outras áreas que também merecem atenção, mas nessas as pessoas, avalia, já são mais articuladas e muitos são produtores culturais ou artistas. “Não tem como colocar na balança da mesma forma, tem que adequar”, disse.

Segundo Isabella, “Nas pré-conferências a gente ouviu de tudo um pouco, desde necessidade de produtos, centros culturais, identificação de locais já existentes e criação de novos, bem como as coisas agregadas a isso”. Registrou que “Muita gente reclamou: eu quero um espaço cultural, mas tenho medo de sair à rua porque não tem iluminação. A gente fez papel de ouvidoria.” Acrescentou que uma próxima etapa será selecionar, depois da Conferência, “democraticamente, através do voto, quais itens nos vamos trabalhar.”

Teatro não está pronto

O teatro ainda não está aberto ao público porque, apesar da aceitação da obra pela Prefeitura, ainda são necessários investimentos para tornar utilizável aquele espaço, visto que ainda carece de complementos e obras de segurança, inclusive para a obtenção do Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros, conforme esclareceu o prefeito Moromizato. Contudo, chegou a ser utilizado, em duas ocasiões, ainda na gestão do prefeito Eduardo César, por empresa local de eventos, de propriedade de um coordenador de uma “Comissão de Cultura”. Essa “comissão”, constituída por um autodenominado “povo da cultura”, elaborou as bases do projeto aprovado pela Câmara Municipal para inclusão de Ubatuba no Sistema Nacional de Cultura.

Nomeada por Eduardo César

Isabella Vassão foi nomeada, para mandato de dois anos, pelo ex-prefeito Eduardo César, no apagar das luzes da apagada gestão municipal anterior. Candidata ao Legislativo municipal, pelo PT, Isabella, que acumulava patrimônio de R$ R$ 78.968,00 segundo declarou à Justiça Eleitoral, gastou R$ 4.846,00 na campanha eleitoral e teve 382 votos, o que a colocou como terceira suplente da coligação Pra fazer Ubatuba Brilhar I - PT/ PSDC. Um desses votos foi o meu. Apesar dos notórios vínculos com partido opositor à candidatura apoiada pelo ex-prefeito, Isabella foi nomeada por Eduardo César, quando já conhecidos os resultados da eleição. Negou que tenha havido ajuste político, “foi até uma surpresa”, e afirmou que, incluída na lista sêxtupla elaborada pelo Conselho Deliberativo da fundação para nomeação pelo prefeito da época, que deveria ocorrer até 31 de dezembro, já tinha antigos vínculos com a cultura local e com a Fundart. Efetivamente, já foi encarregada das finanças da Fundação e sempre participou dos grupos setoriais. Reafirmou seu compromisso com a gestão atual, do prefeito Moromizato, dizendo que “não tinha compromisso com Eduardo, mas com Maurício tenho sim, de mudar melhorar a cidade, interesse da população, com certeza”.
Isabella Vassão não é caiçara: mineira de Itajubá, é contudo consciente defensora da cultura caiçara. Tem carisma pessoal (o sorriso invade facilmente seu rosto) e articula-se com os diversos (e por vezes conflitantes) segmentos culturais do município.

A entrevista

A presidente da Fundart fez as afirmações em entrevista (gravada pelo Juruna, vide “Narigão” e “Adendo”) a O Guaruçá, revista eletrônica do portal UbaWeb. O primeiro pedido de entrevista foi logo no início do mandato, na primeira quinzena de 2013, resultando em agendamento para data certa: 18 de janeiro. Contudo, por intervenção direta do então ouvidor municipal, o jornalista Saulo Gil, que fazia (e ainda faz) as vezes de assessor especial de Comunicação do prefeito Maurício Moromizato, Isabella cancelou a entrevista, através de assessora, esquivando-se de contato direto, sem dar maiores explicações. O segundo pedido foi feito quando a presidente concedia entrevista ao vivo à rádio Costa Azul, acompanhada pelo assessor de comunicação da Fundart, Flávio Mansur, para divulgar a festa de São Pedro Pescador. À pergunta se já estava autorizada a conceder entrevistas, respondeu, ao vivo, no ar, que sim. Na mesma data, Isabella recebeu-me na sede da fundação. Em vez da presença do assessor de comunicação, quem iniciou a condução da entrevista foi o advogado Valdir Aguiar Santos, assessor jurídico da fundação. Começou opondo dúvidas e restrições, bem como grosseiramente acusações, as quais retirou após fortemente contestado, possibilitando o início da entrevista, na qual não mais interviu. Isabella saiu em defesa do assessor: disse que o advogado Valdir é um faz-tudo, servindo desde motorista a eficiente assessor jurídico, além de escritor.

A postergação da publicação da entrevista implicou, certamente, numa aposta: a de que não perderia a atualidade. Não perdeu. Ainda não foi divulgada qualquer conclusão sobre os trabalhos das comissões instituídas por Moromizato, sobre teatro e centro de convenções. Em terra de Mamô, nada de pressa.


-texto originalmente publicado na revista eletrônica O Guaruçá, em 30/07/2013. 


quinta-feira, 25 de julho de 2013

Genoino transferido de Ubatuba para Sírio-Libanês

O deputado federal José Genoino (PT) passou a madrugada em cirurgia de emergência, que terminou por volta das cinco horas desta quinta-feira, no Hospital Sírio-Libanês. O parlamentar foi atendido na Santa Casa de Ubatuba na manhã de ontem (24), quarta-feira, sentindo forte mal-estar. Os médicos locais não detectaram sintomas de infarto do miocárdio e o mantiveram internado em observação, até a tarde de ontem. Por volta das 15h30, Genoino foi transferido, em ambulância, para o Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo.

Segundo um de seus assessores, José Genoino teve dissecção da aorta, principal artéria que parte do coração, e precisou passar por cirurgia de emergência, que começou pouco antes da meia-noite, com previsão de duração de seis horas. Genoino ficará na UTI pelo menos nas próximas 24 horas. O assessor disse que o atendimento na Santa Casa de Ubatuba foi adequado e que foram realizados os exames possíveis. Contudo, o hospital local não tem os equipamentos de alta complexidade, o que tornou necessária a remoção do paciente para o hospital de São Paulo. Acrescentou que o parlamentar, aproveitando o recesso do Legislativo, estava a passeio em Ubatuba, com seus netos.

José Genoino, de 67 anos, cumpriu seis mandatos de deputado federal, pelo PT de São Paulo. Candidato nas eleições de 2010, ficou como primeiro suplente, e assumiu novo mandato em janeiro deste ano, depois de ter sido assessor do Ministério da Defesa e de, em agosto de 2012, ter sido condenado pelo STF no chamado processo do Mensalão.

Aorta
A dissecção ocorre quando a parede da artéria aorta, a maior do corpo, que tem três camadas, se rompe. O rasgo interno faz o sangue se propagar até a camada intermediária, forçando-a. Se o rompimento afeta a terceira camada ocorre massiva perda de sangue. Em qualquer dos casos, trata-se de ocorrência grave e de alta taxa de letalidade.

- texto originalmente publicado na revista eletrônica O Guaruçá, em 25/07/2013

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Crise no Thamar Ubatuba por causa de Mamô


Ensaio phictício em ortographia muito amptiga exagerada

Tá bão, mas Thamar... Abriu-se crise na filial ubatubense do empreendimento philantrópico Thamar. É que os especialistas não se acertam quanto ao acolhimento, em seu mini-zoológico aquático, do Mamô, certamente um quelônio, mas não marinho. O problema é que se trata de uma tartaruga urbana, com traços genéticos italianos (quase com certeza da Calábria) e japoneses.

Ágeis nas águas, as tartarugas marinhas nem de longe são aparentadas com a tartaruga urbana mestiça de Ubatuba, o Mamô, que tem mais semelhanças com o jabuti, quelônio terrestre capaz de andar a incríveis 300 metros por hora. Essa é sua velocidade máxima. Mas raramente anda mais do que 50 metros em uma hora e faz, então, uma generosa pausa. Considerando a velocidade média, sem as pausas para descanso demoraria uns (40 m/h, 90 km) 94 dias para percorrer a orla de Ubatuba. Como dorme 10 horas por dia, senão mais, seriam necessários uns 190 dias para percorrer o trecho. O pior é que Mamô é meio cego, meio surdo, meio mudo e meio sem noção, além de não saber ler.

Há um problema a mais: Mamô já foi publicamente chamado de corrupto, e não deu qualquer resposta. Os Callichirus major da praia do Ubatumirim, chamados de vermes honestos do mar, protestaram de seus buracos, sem cair no modismo de sair em passeata, mas ostentando cartazes: "Não sou verme, sou crustáceo", "Sou corrupto com muita honra" e "Não chamem Mamô de corrupto, ele não é da família Callichirus".

Os especialistas do Thamar foram além e descobriram algo inusitado: Mamô é frequentemente flagrado de calças curtas, mesmo considerando que suas pernas, não é mentira, são curtíssimas. Na razão direta do encurtamento das calças, cresce o nariz de Mamô, adotado como bicho-símbolo nos boletins de um certo partido político local. Esse nariz encompridado anda na mira de um bacamarte, que já alvejou alguns bichos locais, incluindo um Phalacrocorax brasilianus.

Eita quelônio cumpricado esse Mamô, sô!


- texto originalmente publicado na revista eletrônica O Guaruçá, em 15/07/2013. 

sexta-feira, 5 de julho de 2013

`Narfabetismo´, um desvalor para Ubatuba

As quatro crases [no “cartaz” abaixo] são uma afronta à língua portuguesa. Turismo de qualidade, Ubatuba brilhando, acolhedora, produzindo esse tipo de convite que um "narfa" escreveu, e alguém não revisou? Quanto mais se escreve, mais erros ocorrem. Errar não é o problema, eu erro, tu erras, ele erra, nós erramos, vós errais, eles erram, e (eu) muitos erros cometo, certamente. Errar não é o problema. O problema é não revisar antes da publicação. Que o diga o editor desta revista, que revisa e me dá croques na cabeça, de vez em quando – e ainda assim, na correria do dia-a-dia passa muita coisa... Não revisar é o problema, especialmente quando é um cartaz para ser impresso, coisa eventual que custa dinheiro. Colocar dinheiro público em algo sem qualidade faz obscurecer, e não brilhar, qualquer cidade, especialmente as de vocação turística, que pretendem turismo de qualidade.
Divulgação PMEBU

- publicado originalmente na revista eletrônica O Guaruçá, em 04/07/2013

segunda-feira, 1 de julho de 2013

O Centro de Convenções de Ubatuba ficará pronto até carnaval de 2014

O prefeito de Ubatuba, Maurício Moromizato (PT), afirmou que o Centro de Convenções ficará pronto até o carnaval de 2014. Usando a expressão em inglês "deadline" (que em cronogramas é entendida como a data-limite de conclusão), disse que a estrutura será usada no Congresso de Secretários de Saúde, previsto para o período entre o carnaval e a Semana Santa do ano que vem, "mas na verdade nós queremos que fique pronto muito antes disso".

"Inaugurado entre aspas" no final da gestão Eduardo César, o Centro de Convenções não tem Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros, não tem fossa séptica, não tem sequer padrão elétrico de entrada e a obra apresenta outros problemas, tanto que "não foi aprovada pela vistoria do DADE" (Departamento de Apoio ao Desenvolvimento de Estâncias, que gere o Fundo de Melhoria das Estâncias, criado pela Constituição de São Paulo, origem principal dos recursos usados no Centro de Convenções). O prefeito esclareceu que está cobrando da construtora refazimento onde foram detectados problemas e complementação das obras onde não foram realizadas. Citou o caso do asfaltamento realizado no local: "feito em dia de chuva, está degradado". Mas advertiu que será necessário gastar recursos financeiros municipais com as duas obras, "mais no Centro de Convenções e menos no Centro do Professorado".

Quanto ao Centro do Professorado, que inclui um teatro, apesar de mais próximo de ter a obra liberada para uso público, "o problema é que a Prefeitura deu a obra como entregue", apesar de incompleta. Maurício disse que está em curso uma auditoria sobre o Centro do Professorado, já que "o secretário da gestão anterior não informou" e é necessário saber quem pagou, se os recursos foram oriundos de rubrica orçamentária da Educação, o que definirá o uso possível da obra. De qualquer forma, "não foi inaugurado, não tem AVCB (Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros), e tem um Termo de Ajustamento de Conduta firmado com o CONDEPHAAT (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico vinculado à Secretaria de Cultura de São Paulo).

O prefeito Maurício informou que há dois comitês ligados ao seu gabinete, encarregados de analisar essas "duas estruturas de construção da administração passada, não liberadas para uso". Uma das comissões é composta por representantes da Secretaria de Gabinete, Secretaria de Arquitetura e Urbanismo e Fundação de Arte e Cultura de Ubatuba - Fundart, no caso do Centro do Professorado (e o teatro nele integrado), e ambas as secretarias e mais a Secretaria de Turismo, no caso do Centro de Convenções.

Indagado sobre o interesse dos empresários locais, que "dizem que o Centro de Convenções é o melhor negócio do mundo", coisa para parceria público-privada (PPP), "alguma proposta de investir dinheiro privado nisso?" A resposta foi negativa. "Nenhuma proposta de gestão, a priori será gestão pública, direta". Maurício esclareceu que, de qualquer forma, não seria PPP, "porque não existem parcerias desse tipo de valor inferior a 20 milhões de reais". Acrescentou que "Seria o caso de cogestão ou terceirização da gestão, ou gestão pública plena". Mas, de qualquer forma, não recebeu qualquer proposta de investimento de empresários no empreendimento.

Quanto ao teatro do Centro do Professorado, disse que houve sondagem, feita pela Porto Seguro, de um aporte financeiro anual, por cinco anos, para darem nome ao espaço, "como o Credircad Hall, por exemplo". Mas não como gestão do espaço, frisou. As negociações sobre isso ficaram inconclusivas, visto que o espaço não está ainda pronto para ser usado.

Povo da Cultura
Maurício afirmou que não há relação formal alguma entre a Prefeitura e uma "Comissão da Cultura", que elaborou as bases da lei municipal de Cultura, obrigatória para que o município se inscrevesse no Sistema Nacional de Cultura, "lei que já deveria ter sido aprovada na gestão anterior". Disse: "Revisamos o projeto, que estava dentro dos parâmetros do Ministério da Cultura, e enviamos para a Câmara para aprovação. Ponto. Aquela comissão esgotou sua função. Estamos agora no momento da Conferência Municipal de Cultura, gerida por uma comissão específica, que não tem dependência nem interdependência com aquela comissão".

Análise - Obras incompletas
A "Comissão da Cultura" que elaborou o anteprojeto da legislação municipal para ingresso no Sistema Nacional de Cultura era integrada por um grupo que se autodenominava "povo da Cultura". Um de seus coordenadores tem empresa de promoções artísticas em Ubatuba.

Como, além de incompletos, os dois prédios não têm tem o Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros, não podem ser abertos ao público, apesar dos usos que já tiveram na administração anterior. No caso da "inauguração" do Centro de Convenções, prestaram-se à farsa, "abençoada" pelo pastor Kerliab Soares, o Museu do Automóvel, o Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares do Litoral Norte (Sinhores), e o Ubatuba Convention & Visitors Bureau, além do ex-prefeito Eduardo César "et séquito". As informações foram obtidas na internet, conforme links citados abaixo.

No caso do "teatro", beneficiou-se empresa de promoções artísticas de Ubatuba, para encenação de espetáculos teatrais, com bom público, que no entanto correu riscos de segurança. Existe demanda por espetáculos do tipo, certamente. Cita-se comumente "economia criativa". Economia criativa não é deixar ao poder público o ônus de gastar dinheiro construindo um teatro, para depois utilizá-lo sob o discurso de não usar recursos públicos municipais. De não passar o pires, depois de ganhar o imenso pires. O "povo da Cultura" certamente ganhou enorme pires.

Seno
Seno, cosseno, tangente, integrantes de uma família da Geometria euclidiana. Pedro é Seno, nem cosseno e muito menos sai pela tangente. Em fase de conclusão do presente texto, precisei de seu auxílio, o do Pedro Seno, titular da Assessoria de Tecnologia da Informação, vinculada ao Gabinete do Prefeito. Ele fez lá suas pesquisas eletrônicas e, menos de duas horas depois do pedido, veio com a resposta, infelizmente negativa: "Verificamos o banco de dados SQL com as notícias relativas a gestão anterior e não há nenhuma notícia que trata especificamente da inauguração do Centro de Convenções de Ubatuba. Há notícias relacionadas ao Centro, mas nada sobre a inauguração." Fiz a ele pedido para integrar as notícias anteriores ao novo site da Prefeitura, considerando "que o conjunto das notícias produzidas pela antiga Assessoria de Comunicação pertence ao acervo municipal, visto que foram produzidas com dinheiro do contribuinte ubatubense, e devem ser disponibilizadas no site da Prefeitura, como registro histórico".

Fica, portanto, a dúvida. Há, citando como fonte a "Assessoria de Comunicação – PMU", textos idênticos, bem como fotos exuberantes, creditadas a Ana Gabriela (Fernandes), nos links 1 e 2. Politizar propagando inauguração farsesca?

Latinismo impróprio usado no texto: "Et séquito" (metade latim, metade português, como figura de estilo).

- texto originalmente publicado na revista eletrônica O Guaruçá, em 01/07/2013.

quarta-feira, 26 de junho de 2013

É o Saci Urbano em Ubatuba


Recebemos esta semana, eu e a Marlene, aqui no nosso cantinho no pé do Funhanhado, o artista Thiago Vaz (thiagovaz.com.br), cujo heterônimo Iderê Dudu da Silva (algo como Madeira Escura da Floresta), hora nascituro no mundo artístico, é o autor do É o Saci (Urbano). Esteve acompanhado da dulcíssima Vanessa, para um almoço e uma conversa com o Julinho Mendes e com o editor desta revista, Luiz Roberto de Moura. A comida ficou por conta do mestre-cuca caiçara Julinho, que nos presenteou com um magnífico Azul Marinho, acompanhado de pirão, arroz e salada. Claro que demos nossa contribuição, disponibilizando o fogão e uma faca de cozinha com corte apenas razoável. Até a panela o Julinho trouxe. Sua generosidade foi ao ponto de ensinar à Marlene, passo a passo, como preparar a iguaria caiçara, da qual o Luiz Roberto explicou a origem: caiçara sabe que dá trabalho plantar mandioca (bem entendido, a planta com sua raiz comestível) e depois ralá-la e passar pela pedra de mó para virar farinha. Por conta disso, usa a banana  verde, que dá às pencas nas antigas terras de Coaquira. E em contato com a panela de ferro, a banana verde fica com o tom azulado que dá nome ao prato.

Iderê Dudu da Silva é heterônimo de Thiago Vaz, um jovem artista plástico baiano de nascimento que mora em Ribeirão Pires (SP), cujas intervenções em paredes e muros de São Paulo e outras cidades revelam trabalhos de alta qualidade e com uma ideia criativa, original, o Saci Urbano. É o mesmo nosso brasileiríssimo Saci Pererê, ou, como é conhecido aqui no litoral, Saperê. Mas é um Saci contemporâneo, urbano, calçado com tênis mas sem dispensar o cachimbo e o gorro vermelho, não o pontudo, outro mais assemelhado a um gorro. Nascido do mesmo colmo de bambu em dias de chuva como o Saperê, vive, contudo, no ambiente urbano, sujeiro às mesmas angústias que levaram às atuais manifestações dos jovens brasileiros. Ciclista, amante das ciclovias, quer um ambiente urbano no qual tenha mobilidade e no qual não precise causar poluição. Preocupa-se com as causas sociais, sem abandonar suas traquinagens: tem sempre um estilingue à mão, e não hesita em usá-lo para afugentar algum eventual rato Mickey que esteja a roer alguma abóbora, que é alimento para consumo humano e não para servir de lampião de raloim. E é aí que entra o Julinho, o criador do Raloim Caiçara, justamente no Dia do Saci.

Iderê sabe que a parte física de sua obra sofre de atroz efemeridade: se o proprietário do imóvel cujo muro foi presenteado com a obra de arte não a compreende, xingando-a de pichação, mandará pintar uma mortalha branca por cima. É também como as prefeituras costumam agir. Se a compreende ou, mesmo, se apenas gosta dela, permitirá sua exposição à radiação solar, à nociva radiação ultravioleta que esmaece qualquer tinta, à chuva que carrega poluentes, ao ar poluído (especialmente o de São Paulo). A obra física é efêmera, mas a ideia, o brilho da criatividade, é perene. Esse é o Saci Urbano, "É o Saci", a assinatura tímida de Iderê.
Em conversa de artistas não se mete a colher. Puderam conversar um pouco, Thiago e Julinho, e quem sabe não armam alguma coisa para o fim de outubro deste ano, aqui em Ubatuba? O futuro só o futuro revelará, mas nossa torcida é para que, em meio às chuvas de outono, nasça de algum colmo de bambu algum belo Saci caiçara, que se integre à paisagem urbana de nossa linguiça espremida entre o mar e a serra, a nossa Ubatuba.

Expusemos intimidades. Confirmamos: de perto, ninguém é normal. Mas ficou a certeza de que Iderê tem uma genialidade que talvez não alcancemos, nem nós nem ele, em profundidade, e que, queira ele ou não, compreenda ele ou não, se expressa através do Saci Urbano. De mim, confirmando suspeitas recentes, fica a certeza de que, dito de maneira muito doce, calou fundo a possibilidade de que eu esteja mesmo numa fase pré-Alzheimer, merecedora de cuidados. Além, claro, de minha rigidez racional constitucionalmente arraigada (o erro de Descartes, já denunciado em livro da obra do neurologista português António Damásio, que não por acaso minha filha Tatiana me deu de presente). O que não me impede, é claro, de ver os Sacis que rondam nosso cantinho no pé do Funhanhado.

Adendo
Um adendo. Talvez uma origem remota do Saci esteja no folclore asturiano, diz o site de etimologia Origem da Palavra, que não revela nomes de seus autores: trata-se do Trasgo. Baixinho, moreno, mancava da perna direita, vestia-se de vermelho e usava um gorro pontudo da mesma cor, diz o site: "Hoje vamos começar por um ser que visitava as casas de nossos antepassados do Norte de Portugal, o trasgo. Este era o equivalente aos gnomos e duendes de outras culturas. Seu nome era trasgu na mitologia asturiana.

Ele era baixinho, moreno, mancava da perna direita e tinha um furo na palma da mão esquerda. Vestia-se de vermelho e usava um gorro pontudo da mesma cor. Não era difícil reconhecê-lo, portanto.

Não façam essas caras de medo, ele não era dos piores. Ele era o responsável pelos barulhos que uma casa faz à noite e às vezes ficava travesso e quebrava alguma louça. De minha parte, acho que mais de um prato foi quebrado pelas crianças da casa e ele acabou levando a culpa.
No fundo ele era bonzinho, pois até fazia serviços domésticos quando se sentia bem tratado."
Alguma semelhança com o Saci-Saperê que descrevi em março de 2010? "Saci-Saperê, só para concluir, é o mesmo Saci-Pererê. É o Saci-perereg (do Tupi-Guarani Çaa Cy - olho mau; perereg - saltitante), do depoimento de M. L. de Oliveira Filho citado por Monteiro Lobato em seu (grafia original) "O Sacy-Perêrê - Resultado de um Inquérito", publicado em 1918. Usei a forma Saperê porque, nas palavras de Lobato, citando o depoimento de Procópio Silvestre, "No litoral é comumente chamado de Saci-saperê (pág 317)". Procópio acrescenta: "Os sacis do litoral apesar de travessos são bondosos, bem comportados, e alguns religiosos até."
Há sempre uma advertência necessária, quando se trata de Dudu. Jamais, leitor que conseguiu chegar ao fim do quilométrico texto, confunda o Dudu nome do meio do Iderê com um certo político local que infelicitou esta cidade.

- texto originalmente publicado na revista eletrônica O Guaruçá, em 26/06/2013.

Maurício: `Ainda não fui à Sabesp´

O prefeito de Ubatuba, Maurício Moromizato (PT), em evento sábado, dia 25, da "Prefeitura no Bairro" no Perequê-Mirim, disse que ainda não foi à Sabesp, apesar de ter recebido dirigentes locais da empresa em seu gabinete, para ouvir as demandas, "e estou ajudando". Segundo ele, ainda não é o momento de ir à empresa de saneamento para cobrar obras e responsabilidades e, eventualmente, dinheiro

O prefeito explicou que está se preparando, buscando informações técnicas e jurídicas, inclusive cópias dos contratos entre a empresa e cidades como Taubaté, São José dos Campos e Botucatu, "porque não se pode ir com muita sede ao pote e depois perder na justiça". Citou como exemplo de possíveis cobranças que a Sabesp não pagou nada a Ubatuba pela concessão do saneamento em gestões passadas, enquanto que Taubaté recebeu R$ 60 milhões e São José dos Campos R$ 80 milhões.

O prefeito explicou que a situação mudou a partir da criação da Região Metropolitana do Vale do Paraíba e Litoral Norte, porque o Governo do Estado interpreta que existindo a Região Metropolitana o saneamento básico deixa de ser municipal e passa a ser regional, caso em que o município perderia a titularidade da concessão do saneamento. A controvérsia, disse, já chegou ao Supremo Tribunal Federal. De qualquer forma, "o saneamento básico não está nas mãos do governo municipal, apesar de ser concessão municipal". Reafirmou a posição que assumiu em sua carreira política a favor do saneamento básico, pois sabe "o quanto impacta favoravelmente na saúde e no turismo". Acrescentou que "talvez, por conta desse histórico", a empresa em Ubatuba está mostrando boa vontade. No entanto, disse que "a Sabesp poderia ser muito mais rápida do que é".

O tema foi levantado por Elcio Machado, que disse ser morador em Ubatuba, no Perequê-Mirim, há cinco anos e que, durante esse período, a praia do bairro tem sido a mais poluída do município, "mais poluída do que a famosa praia do Itaguá". Afirmou que um dos principais problemas do bairro é a falta de saneamento básico, "saneamento pra valer, água tratada até o sertão, esgoto". Mencionou que haverá o problema da duplicação da conta paga mensalmente pelos moradores (que já têm água da Sabesp), quando houver coleta de esgoto, e que então os políticos precisarão se posicionar. Acrescentou que "Só que a Sabesp tem que falar que vai fazer, e fazer. Ouvir falar de onda limpa e uma porção de coisas, mas de concreto pouco acontece aqui no Perequê-Mirim".

O prefeito corrigiu que a poluição é na água do mar, o que está comprometida é a balneabilidade, não a praia em si. Quanto à questão das marinas, levantada por outro morador, quem respondeu foi o secretário de Meio Ambiente, Juan Blanco Prada, que disse da legislação sobre o tráfego de tratores para tirar e colocar barcos na água, "em linha reta", não para ficar circulando pela praia. Pediu que a população denuncie, se possível como fotos, porque sua pasta tem apenas dois fiscais e carro uma vez por semana para fiscalizar toda a extensão do município. Para as denúncias, informou o telefone 3833-4400, da Copam, Comissão Municipal de Proteção e Defesa Ambiental.

- texto publicado originalmente na revista eletrônica O Guaruçá, em 28/05/2013.

sábado, 22 de junho de 2013

Moromizato: nenhum plano para a av. Nove de Julho

O prefeito de Ubatuba, Maurício Moromizato, em entrevista à revista O Guaruçá, afirmou que a posição oficial da Prefeitura é a de que não há, neste momento, nenhum plano para alterar a situação da avenida Nove de Julho, paralela à rua Guarani, no Itaguá. Disse que, no início da atual legislatura, o presidente da Câmara, vereador Xibiu, solicitou-lhe, oralmente, que estudasse a possibilidade de abertura daquela via ao tráfego de veículos de emergência, "ambulância e bombeiro", principalmente na temporada, "e todo mundo sabe que ali é uma avenida". No entanto, disse, "há um decreto aprovado pela Câmara, não sei precisar qual, de muitos anos atrás, transformando aquela avenida no que é hoje, e a Prefeitura não tem intenção nenhuma em revogar esse decreto".

O prefeito mostrou posição semelhante quanto à avenida Marginal norte (sertão) do Perequê-Mirim, paralela à rodovia sob gestão estadual, SP 055 Manuel Hipólito Rego, na altura do quilômetro 60. Disse que não tem compromisso nem de manter como está nem de abrir, "não fez parte de nenhum compromisso político com comerciantes e lideranças do bairro, nem foi tratado na campanha eleitoral". Lembrou que esteve no local, quando do evento Prefeitura no Perequê-Mirim, e que pediu ao administrador regional (Centro-Sul) estudos sobre o local, para melhoria no trânsito de veículos. Mas não se comprometeu com prazos: antes de qualquer cronograma são necessários recursos. "Tenho muita clareza de que uma das questões a ser colocada junto ao Governo do Estado e DER, ou, se houver a federalização da rodovia junto ao Governo federal, é a abertura das marginais", disse.

A origem dos recursos seria o Departamento de Apoio ao Desenvolvimento das Estâncias – DADE, vinculado à Secretaria Estadual de Turismo, que gere o Fundo de Melhoria das Estâncias, ou o Plano de Aceleração do Crescimento do Governo federal, o PAC, caso ocorra a federalização da rodovia.

A polêmica
Projetada como via de tráfego, a avenida Nove de Julho, que começa em sua ligação com a rua Leovigildo Dias Vieira, na altura da praça Alberto Santos (a dúvida é se a homenagem é a Alberto Santos, advogado, político, três vezes prefeito de Ubatuba, ou Alberto Santos Dumont, reverenciado aviador), conhecida também como "praça do esqueleto" (onde há o esqueleto de uma baleia), vai até a praça Capricórnio, em frente à continuação da diretriz da pista do aeroporto local. Essa praça tem uma pista de skate. A avenida não está mais aberta ao tráfego, exceto, em um trecho, pela calçada, para moradores para os quais a via é a única forma de acesso a seus imóveis. A calçada também está ocupada por estabelecimentos comerciais, em uma parte. Onde seriam as faixas de rolamento da avenida existem alguns equipamentos para lazer e alguma arborização, bem como uma ciclovia. Através de indicação, o vereador Xibiu, presidente da Câmara e integrante de uma das coligações partidárias que apoiou o atual prefeito, pediu ao Executivo, que tem a exclusiva competência para iniciativa a respeito, a liberação daquela via ao tráfego geral de veículos, e não apenas aos de emergência. A proposição, apresentada na sessão do Legislativo de 12/3/2013, motivou reação de moradores e comerciantes daquele trecho, que fizeram abaixo-assinado e pretendem continuar com seu uso preferencial da via como é hoje, repudiando tráfego de quaisquer veículos. Na sessão da Câmara do dia 18 último, ao ocupar a Tribuna Popular, Elton Herrerias, vinculado a atividades de skatismo, leu o abaixo-assinado em repúdio às mudanças propostas. Na mesma sessão, foi veiculada a informação de que a indicação do vereador foi arquivada.

Há outra questão referente àquele trecho, que é a regularidade dos imóveis, bem como o fato de terem sido aprovados desmembramentos de lotes que descaracterizaram o projeto original.
Não foi possível confirmar a afirmação de Maurício sobre "um decreto da Câmara", que ele não soube precisar qual é. Nada a respeito foi localizado com o uso do sistema de buscas do portal do legislativo, nem quanto a decretos, nem quanto a leis. De qualquer forma, exceto para administração interna da casa, a Câmara Municipal não edita decretos, que são atribuições do Executivo.

Quanto à avenida marginal do Perequê-Mirim, o que obsta o tráfego de veículos em seus dois primeiros quarteirões a partir do acesso do quilômetro 60 da rodovia é um coqueiro, protegido por um pequeno poste de concreto. O coqueiro é usado pelo comerciante local para colocar faixas de publicidade de seu estabelecimento.

Entrevista
A entrevista foi concedida dia 10/6/2013, depois de várias solicitações desde o início do mandato do atual prefeito, mas afinal acabou sendo agendada por iniciativa da própria Prefeitura, através da Ouvidoria municipal, cujo titular é o jornalista Saulo Gil. Foram tratados outros temas, que serão abordados nas próximas edições.

-Texto originalmente publicado na Revista Eletrônica O Guaruçá, em 21/06/2013.