segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Ubatuba, Guerra, a paz de Gandhi, o túnel


Recebi hoje delicada cobrança do Marcos Guerra, por estar sumido aqui da revista O Guaruçá. Estou bem, mas ainda às voltas com problema de saúde em família, o que me impede de completar o processo de mudança para Ubatuba. Estou, pois, ainda, em Assis, a 700 km da cidade onde já mora meu coração.
Costumo escrever aqui em primeira pessoa, o que, no dizer de Pedro J. Bondaczuk, é uma prática que sofre condenações e epítetos de "arrogante, imodesto, convencido e outros quetais." Mas ele próprio, que também escreve em primeira pessoa, completa: "Bobagem. Entendo que se trate de manifestação de personalidade, de autoconfiança, de certeza quanto ao que escreve." Discordo do Pedro, quanto à parte final: ainda que se trate de manifestação de personalidade, nada tem de autoconfiança, de certeza quanto ao que se escreve. Tenho certeza de muito poucas coisas, cada vez menos, com o passar dos anos. Tento cultivar, faz tempo, o ver "o outro lado", talvez herança da formação na prática jornalística. Mas isso também não é fácil, minha mulher que o diga.
Recolhe-se, de Nietsche, que "As convicções são inimigas mais perigosas da verdade do que as mentiras." Ele vai além: "Não há fatos eternos, como não há verdades absolutas." É bom ter convicções, mas temperadas pela dúvida. Tudo o que é pétreo, petrificado, revela uma certa ausência de vida. Isso vale também para as convicções pétreas. Só quem está vivo tem mobilidade, não é pedra.
Digo isto porque, apesar de ausente como autor, continuo sendo leitor ávido da revista O Guaruçá. Li os textos do Marcos Guerra, nesses últimos dias. Concordo com muito do que ele diz, mas tenho dúvidas, algumas severas, quanto a outras. Por exemplo, não quero integrar os 80% inadimplentes com o Imposto Predial e Territorial Urbano, mas quero aceitar a convocação que ele fez, em IPTU e a desobediência Civil em Ubatuba. Ele convoca uma grande parcela de moradores, definitivos ou eventuais, a transferir para Ubatuba seu título de eleitor. Já fui ao cartório eleitoral (onde fui muito, mas muito bem atendido, é conveniente dizer).
Tenho sérias dúvidas quanto a essa forma de desobediência civil porque, ao longo da vida, observei que ela acaba beneficiando não os humildes, os desendinheirados, mas aqueles que têm caixa e postergam os pagamentos porque sabem que haverá, ao depois, uma anistia fiscal dos acréscimos. Então, se posso pagar depois de amanhã, pelo mesmo preço de ontem, por que pagar em dia? Por conta dos "prêmios" oferecidos? Ora, convenhamos, é um chamariz para lá de ineficaz, como prova o índice de 80%.
O cerne da questão, acho, não está em pagar ou não pagar o IPTU em dia, mas em exigentemente fiscalizar a correta (do ponto de vista do bem público) aplicação dos recursos. Vale para coisas grandes e pequenas, conforme o ponto de vista. Vale para os grandes dispêndios com a destinação final do lixo, e vale também para as despesas menores, desnecessárias e perniciosas, como a vandalização e destruição do mosaico português escherniano, como, em 2006, mencionou Ramon Ruiz Escobar, ao fazer sua pergunta Um artista holandês em Ubatuba? Aliás, por onde anda o Ramon, já que seu e-mail, citado naquela matéria, já não está mais operacional?
Parte do material que compunha o vandalizado (pela Prefeitura, sob Dudu) mosaico português está na foto do Guerra que mostra: Não há luz no fim do túnel. Não sei se concordo. Diria, talvez, ainda não há luz no fim do túnel. Algumas ações judiciais do Guerra apontam para um fim de túnel, onde, eventualmente, haverá luz. O próprio mecanismo da democracia, se tudo o mais falhar, retirará o atual "dono do pudê" ao final de uns tantos dias, que o Moura, de boa memória, sabe contar.
Abre-se, aqui, outra interessante questão. Poderíamos, cautelosa e preventivamente, exigir compromissos dos próximos candidatos, para que tivéssemos bússola minimamente segura para nos orientar nas próximas eleições municipais. Mas, afinal, que segurança resulta de compromissos publicamente assumidos, como à farta nos revelou o Guerra ao registrar o em Greenpeace em Ubatuba? Houve alguma ação para tornar Ubatuba em efetiva "Cidade Amiga da Amazônia"? Chirico Serra, por escrito, firmou que não abandonaria a Prefeitura de São Paulo para ser candidato a governador do Estado. Valeu de algo?
Não, nenhuma ingenuidade é permitida quanto a isso. É necessário ir além do que diz, afirma e firma o candidato. É necessário saber de quem se acerca, qual a história de sua vida pregressa. Mas isso ainda é pouco. O necessário, mesmo, é ter um mecanismo eficaz de controle, como o previsto no valor universal Democracia: um corpo legislativo que efetivamente fiscalize. E ter, diretamente do seio da sociedade civil, organizações não governamentais que exerçam a democracia direta, controlando, pelos meios possíveis, o que fazem os gestores municipais, sejam do Executivo, sejam do Legislativo. Sobre isso, lembrando, na sequência, Julinho Mendes, a sra. Maria Cruz, o Elias Guerra, a ONG AMARRIBO, já tenho algo escrito, mas ainda não maduro (não sou movido só a ócio, por vezes deixo textos amadurecendo, porque, de impulso, é sempre possível escrever mais bobagens do que aquelas tantas que, inevitavelmente, escreveríamos depois de alguma reflexão. Quanto mais escrevemos, mais bobagens escrevemos, tenho isso como fato).
Há, afinal, uma luz do fim do túnel, porque os eleitores (aqueles que já o são ou venham a transferir título eleitoral para cá) poderão mudar os rumos atuais (ou mantê-los, é necessário dizer). Mas, para isso, será necessário contar com veículos de comunicação de massa sólidos, duráveis no tempo, pluralistas, o que, lamento dizer, ainda não vi em Ubatuba, exceto, talvez, um pouco, aqui em O Guaruçá (o Moura sabe que qualquer dia vou falar sobre isso). Mas esse é outro dos textos sob amadurecimento.    

- Texto originalmente publicado na revista eletrônica O Guaruçá, em 24/1/2010.




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